A “Educação e Autoria na Berlinda Interativa” são os artigos que brindam a quarta parte do livro “A Cibercultura e seu Espelho – Campo de conhecimento emergente e nova vivência humana na era da imersão interativa”, organizado por Eugênio Trivinho e Edilson Cazeloto.
Os autores Marco Silva escrevem sobre “Educação Presencial e Online: sugestões de interatividade na cibercultura” (90-102) e Lucia Santaella sobre o “Fim do Estilo na Cultura Pós-Humana” (103-110).
Silva aponta que a defasagem da escola e da universidade em relação à comunicação multimídia não é solucionada por inclusão de computadores conectados ao ciberespaço, mas pela urgência de uma “pedagogia baseada na comunicação que não separa emissão e recepção e na construção do conhecimento a partir da elaboração colaborativa”.
Aborda essa pedagogia a partir do conceito da valorização das interações e da interatividade. Mesmo os educadores adeptos do construtivismo continuam apegados à pedagogia da transmissão porque não desenvolveram uma “atitude comunicacional que favoreça e promova as interações e a aprendizagem”.
Para o autor essa realidade só será transformada pela “imersão e participação-intervenção do indivíduo”, possibilidade oferecida pelo paradigma da cibercultura, pois mesmo na modalidade online, “o docente ainda trata os aprendizes como recipientes de informação e não como agentes de colaboração, de compartilhamento e de cocriação”.
Enfoca a interatividade e sua banalização ao longo das décadas, ilustrando com a arte do “parangolé” do artista plástico carioca Hélio Oiticica que é uma proposição à participação ativa do público. Silva compara essa realidade à atitude do professor que precisaria propor o conhecimento aos estudantes da mesma forma, ou seja, que eles pudessem “criam, modificam, constróem, aumentam, tornandos-e coautor”.
Alerta os professores para estarem atentos à realidade do hipertexto, redimensionando sua autoria, a fim de se tornarem “formuladores de interrogações, coordenadores de equipes de trabalho, sistematizadores de experiências de construção de conhecimento”. Apresenta cinco princípios da docência interativa, ilustrando que para operar com eles, o professor precisará garantir engajamentos comunicacionais específicos. Registra o termo de “interatividade” como conceito e como práticas de comunicação participativa e colaborativa, como fenômeno social.
Autoria enquanto estilo e criação coletiva
Em seu artigo, Santaella aborda a noção de estilo sob três pontos de vista, a saber: do ponto de vista do talento individual (autoria), histórico e da automação do estilo. E o faz a partir dos conceitos semióticos peirceanos de análise dessa noção em direção aos desafios que o contexto da pós-modernidade e da cultura pós-humana tem problematizado.
“O autor é aquele que interfere de modo particular e pessoal em um processo de signos,” (2009:103) dando uma marca pessoal à sua obra, o “qualissignos”. Enquanto os inventores criam estilos históricos e são difundidos pelos mestres que se apropriam de seus estilos, os imitadores apenas imitam os mestres – e não os inventores. No entanto, são os mestres e os imitadores “os responsáveis por levar um estilo individual até um patamar histórico e coletivo”.
O terceiro ponto de vista resgata o surgimento das máquinas como extensão dos sentidos humanos. Surgem como máquinas sensoriais (SANTAELLA, 1996), não apenas como extensões dos sentidos como queriam McLuhan (1964), mas como semióticas (Nöth, 2001). Isso porque esses aparatos internalizaram no seu modus operandi um certo nível de inteligência capaz de produzir/reproduzir novas entidades que são signos tecnologicamente produzidos que interagem no nosso cotidiano.
É aí que entra a problematização para o estilo, pois os aparatos automatizam o gesto humano da criação, tornando-se parceiros no ato de criar. Isso porque “se concebemos o estilo como marcas de autoria, essas marcas passam a ser compartilhadas com as máquinas em uma mistura de personificação e automatização”. Entra em jogo a criação conjugada que surge da necessidade de desenvolver trabalhos cooperativos e colaborativos.
A era pós-moderna traz a saturação de estilos, levando tendências multitemporais e multiespaciais a conviverem de maneira glocal (realidade global e local). Se a cultura pós-moderna levou ao fim do estilo concebido como padronização de um período histórico, a pós-humana “está colocando sob interrogação o estatuto do talento individual como fonte para uma certa noção de estilo”. Isso porque agora os processos de criação são coletivos, cooperativos e dialógicos e realizados em simbiose com a inteligência e vida artificiais.
Diante disso, questiona: “marcas de autoria são ainda possíveis na cultura pós-humana?”. Junto a essa realidade traz o conceito de interatividade, outro desafio para a ideia de autoria, pois as tecnologias da inteligência são interativas e “nublam as fronteiras entre produtores e consumidores, emissores e receptores”. Nesse sentido, acredita que a interatividade ciberespacial requer a capacidade semiótica do usuário para lidar com as interfaces computacionais.
Textos abertos à construção
Os autores são felizes em suas abordagens, por trazerem presente uma temática desafiadora para a cultura no contexto de ciberespaço que exige reconstrução de novos paradigmas e posturas em vista da interatividade e colaboração.
Enquanto Silva elenca uma série de possibilidades de transformação para o mundo educacional que está a distâncias da realidade tecnológica e digital das empresas e relacionamentos na Web, Santaella deixa em aberto o questionamento mais desafiador: “marcas de autoria são ainda possíveis na cultura pós-humana?”.
Dessa forma, considero os artigos como produções abertas à construção coletiva a partir dos dialógos cibernéticos que possam ir agregando elementos, fundamentando a explanação e exemplificando com novas posturas.
Resenha de autoria de Antonia Alves, Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Escola de Comunicações e Artes, da Universidade de São Paulo.
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